Crises: fiscal e ambiental (por Eduardo Fernandez Silva)

A insustentabilidade fiscal é grave. A ambiental é fatal. [...]

Cresce, no Brasil, o debate sobre os riscos do recorrente déficit fiscal. Muitos culpam o Executivo, embora a responsabilidade dos parlamentos, nos vários níveis, seja até maior. Há mais e mais dinheiro para emendas cash-back e fundo eleitoral. Responsabilidade fiscal? Não no meu quintal, parecem dizer os parlamentares. Preocupam-se, eles, com a questão ambiental? Raros, raríssimos!

A insustentabilidade fiscal é grave. A ambiental é fatal.

A história registra inúmeras crises fiscais. Causaram desconfortos, para colocar suavemente, mas foram resolvidas com diferentes graus de sofrimento e esperteza. A insustentabilidade ambiental foi motivo do desaparecimento de civilizações, com a morte de grande parte de seus habitantes. A esperteza, nesses casos, não funciona.

Momentos de insustentabilidade fiscal foram solucionados, por séculos, mediante a redução do conteúdo de ouro no meio circulante, com a parte extraída recompondo o tesouro real. Essa esperteza foi, mais recentemente, substituída pela inflação.

A grave crise fiscal e cambial – esta é usualmente tida como mais grave que aquela – vivida pelos EUA no final da década de 1960 foi resolvida com a decisão, do Nixon, de não honrar os compromissos assumidos de trocar certo montante de dólares por determinada quantia de ouro. O calote assim aplicado provocou mudanças no mundo, mas não a temida calamidade que, se dizia, ocorreria. A grave crise cambial atual na Argentina foi, se não superada, ao menos adiada pela mão amiga (???) dos EUA.

A enorme falta d’água na região da Cidade do Cabo, poucos anos atrás, foi adiada pela chegada da chuva; e quando esta não chega, ou chega em excesso e subitamente, como no Rio Grande do Sul? Desde 1990, o Brasil já perdeu 15% da sua área coberta por água; mantidas as práticas prevalescentes, a perda continuará. E quando ela alcançar 50%, para onde irão quais brasileiros e brasileiras? Quanta soja, milho e carne exportaremos então?

A crise fiscal pode ser, se não resolvida, camuflada pela inflação crescente. Já vivemos em tal ambiente econômico, que não deixa saudades e é perverso. Mas como viver num ambiente sem água, com temperaturas escorchantes e fogo espalhado por florestas, savanas e cidades? Pesquisas recentes sugerem que a crescente quantidade de plásticos nos cérebros dos humanos pode causar Alzheimer e depressão, além de outros males. Teremos um número crescente de mortos pelas ondas de calor e uma ampliada geração de zumbis, assassinados uns e criada outra, para dar sustentabilidade ao lucro de alguns?

Vamos, então, todos migrar para Marte? Contaremos com a maior sustentabilidade de eventuais lucros com a dessanilização da água oceânica para aproveitar a elevação do nível dos mares e, com tais lucros, assegurar a alguns o privilégio de serem os últimos a morrer devido à insustentabilidade ambiental?

Não é prudente dar total prioridade ao que é essencial e insubstituível, a sustentabilidade ambiental?


Eduardo Fernandez Silva é Mestre em Economia pelo Institute for Social Studies da Universidade de Hague. Foi Diretor da Consultoria Legislativa da Câmara dos Deputados. Autor.