
Quanto mais a economia entra em caos, mais o crédito desaparece. É nesse momento que as empresas mais precisam dele e ao mesmo tempo podem contar menos. Essa contradição revela a fragilidade de muitos negócios que, em tempos de abundância, não se preocupam em estruturar bem suas finanças. Fazem poucas contas, não constroem margem de segurança e acreditam que o acesso ao crédito estará sempre disponível.
Quando a crise chega, a realidade é outra. O banco retrai, os juros sobem, a análise de risco fica mais rigorosa. E a empresa que não se preparou descobre que não tem musculatura de negociação.
Crédito é uma área que sempre me atraiu. Mesmo em posições de gestão, atuei dos dois lados: concedendo crédito a clientes e solicitando crédito a bancos. Sempre fui exigente nesse ponto. Levava a negociação ao limite para garantir margem de manobra, caso fosse necessário no futuro.
E aqui está um ponto essencial: tão importante quanto a taxa é o contrato. Apesar de serem chamados de padrão ou default, existem cláusulas que precisam ser revistas ou ajustadas. Se não houver antecipação, o risco é ficar na forca e aceitar qualquer condição.
Um exemplo recorrente está no lastro das operações financeiras. Quando mal estruturado, limita a bancabilidade, porque concentra exposição em apenas um banco. Essa dependência reduz alternativas e bloqueia a possibilidade de ampliar crédito em momentos críticos. Em outras palavras, a porta se fecha justamente quando mais se precisa atravessar.
Por isso a reestruturação não é apenas ajuste de custos. É rever ciclos de caixa, renegociar dívidas, diversificar relações bancárias e redesenhar o uso do crédito como ferramenta estratégica. A gestão financeira em cenários adversos exige muito mais que disciplina interna. Exige preparo para lidar com fatores externos, política e economia que fogem ao controle, mas impactam diretamente a sobrevivência da empresa.
Crédito em crise não é garantido. É construído com estratégia, previsibilidade e resiliência. E quem entende tem chances de sobreviver ao caos.
Vera Ráimondi é administradora e contadora, com especialização em Finanças Corporativas pela FGV e carreira desenvolvida em consultoria, controladoria e reestruturação empresarial.