Tempo é Vida (por Vera Helena Castanho)

Desde o momento em que chegamos ao mundo, o tempo já se faz presente, marcando o viver..[...]

Tempo,
mediação permanente que acompanha e sustenta a construção de sentido de toda uma vida.

Desde o momento em que chegamos ao mundo, o tempo já se faz presente, marcando o viver.

O primeiro choro.
O abraço que acolhe.
O cheiro que acalma.
O calor que revela o ritmo deste novo mundo.

O seio materno se aproxima do meu ser.
É nesse encontro que vivencio a primeira lição sobre o tempo da vida.
Nesse instante único, somos uma só pessoa: eu e eu, o seio e eu.
Cada sugar anuncia que o tempo determina o prosseguir, o digerir, o existir em um contínuo gesto de aprender a ser.

Tudo é continuidade.

No primeiro tempo de presença viva em um, percebo-me como ser humano autônomo no respirar, no desejar e no sentir.

No calor materno, aprendo a esperar, a alimentar o tempo, a confiar e a despertar para a vida que vai se revelando.

E o tempo segue em expansão, mostrando-me que a vida se mede em instantes silenciosos e invisíveis.

Viver é tempo em movimento.
E chega o tempo do despertar da consciência.

Percebo que algo se desloca em mim na ausência ocasional do olhar materno.
Descubro-me separado.
E o tempo me apresenta à consciência de mim.
Somos eu e você, você e eu, seguindo separados, lado a lado na vida.
Nesse novo tempo, compreendo que vivemos tempos diferentes.

Na pressa do fazer, do ter, do alcançar, esquecemos o que realmente importa:
a consciência do instante presente.

Não se trata de medir, planejar ou controlar.
Trata-se de viver o tempo em sua totalidade, sentir sua passagem, escutar seu ritmo, reconhecer sua profundidade.
A presença transforma segundos em experiência.
Minutos em consciência.
Horas em plenitude.
É no instante da presença verdadeira que a vida se revela de fato.
E talvez a maior aprendizagem seja simples:
estar inteira no tempo que nos atravessa, enquanto ele ainda é o nosso viver.

(Freud chamaria de “tempo oceânico” esse estado inicial de fusão total com o mundo, em que o bebê vive a ilusão de ser um só com a mãe, antes que o tempo o ensine a dizer “eu” diante de um “você”.)


Vera Helena Castanho é Psicoterapeuta em Base Analítica.