
Se o objetivo é reduzir os custos dos imóveis, aumentar a densidade é uma obrigação, mas facilitar e estimular o empreendedorismo e as boas ideias são uma oportunidade.
A curva de valorização de imóveis urbanos e dos salários andou junta, de uma forma geral, em boa parte das cidades do planeta, até a década de 1970.
O fim do padrão-ouro, a crise do petróleo e a hiper regulação (encarecendo as obras com exigências técnicas cada vez mais exageradas) podem estar na gênese dessa distorção, mas a redução da densidade frente a uma infraestrutura cada dia mais cara (cujo resultado é o espalhamento da cidade), são, sozinhos, os maiores vilões.
Enquanto a oferta de crédito ao consumidor busca contornar o aumento desproporcional nos custos, praticamente nada muda no plano das exigências construtivas e de uma regulação urbana que continua a promover a limitação de adensamento e a facilidade de se construir nas cidades.
Tomemos como exemplo uma das vacas sagradas da legislação urbana predominante no país: os afastamentos frontais e laterais que os prédios precisam observar em relação ao próprio terreno.
Essa obrigação, sozinha, impede uma produção que poderia ser 50% maior, quando comparamos um prédio construído observando os afastamentos atualmente obrigatórios, e outro, sem afastamentos. Se os custos do terreno têm um impacto de, mais ou menos, a quarta parte dos custos totais de um apartamento, esse aumento de 50% de adensamento (se os afastamentos fossem dispensados) gera uma redução da ordem de quase 10% no custo total da unidade.
E a beleza da coisa, é que tornar os afastamentos facultativos (faz quem quer), nem chega a ser uma disrupção ou inovação, porque essa foi a regra prevalente em nossos centros urbanos até 1960, 1970. Aliás, é exatamente por conta da ausência de afastamentos frontais e laterais que Barcelona e Paris são 2 das cidades mais densas, mais vivas e com os melhores comércios, serviços, restaurantes e padarias logo ali, fácil e seguro, em lojas abertas diretamente para as calçadas.
Nessas cidades, a densidade populacional chega a ser 3 vezes maior do que as nossas, com prédios de, tipicamente, seis pavimentos, alinhados às calçadas, sem grades, sem muros.
E, para além da redução da altura dos prédios e do aumento da quantidade de apartamentos por prédio, vem junto outras reduções de custo de obra, como menos fachadas a revestir (apenas a frontal), menos fundação, estrutura mais leve e regular, possivelmente otimização nos prazos de construção.
Ganha, ainda, a cidade que, com prédios mais baixos e espaços comerciais junto às calçadas, vê segurança, vê mais gente em cada quarteirão e vê mais gente andando; vê menos carros nas ruas, porque tudo o que a população precisa, passa a estar à distância de uma pequena caminhada.
A crença pela densidade e por prédios sem afastamento não passa, de forma alguma, pelo banimento de prédios altos. Não mesmo, até porque lotes maiores são vocacionados para receber prédios altos, com ainda mais densidade, e colados ou não nas divisas frontal e lateral. Afastamentos frontais e laterais devem deixar de ser obrigatórios; não proibidos.
Edifícios altos e icônicos demandam lotes grandes, e podem oferecer uma potência diferente, e aí afastá-los da borda dos lotes pode ser uma boa estratégia de projeto, até para permitir que o volume do prédio possa ser visto do chão, pelo pedestre.
Se uma cidade tem como objetivo reduzir os custos dos apartamentos produzidos, aumentar a densidade é uma obrigação, mas facilitar e estimular o empreendedorismo e as boas ideias são uma oportunidade.
No primeiro caso, é revisar a legislação urbanística, tirando a obrigatoriedade dos afastamentos frontais e laterais, e aumentando o potencial máximo construtivo. No outro, é descomplicar, simplificar, eliminar regras em excesso e filigranas de aprovação, deixando as boas idéias encontrarem seu caminho.
São os arquitetos e os incorporadores imobiliários que imaginam e fazem a cidade, mas apenas dentro dos limites impostos pelo poder público e pela legislação urbanística. Quanto mais limites, menos iniciativas, menos criatividade, menor velocidade, menos atratividade, e maior o custo. É uma potência represada.
Leon Myssior é Arquiteto e Urbanista, Diretor Executivo da Incorporadora CASAMIRADOR, e fundador do INSTITUTO DA CALÇADA. Autor.

