
– Eu não suporto a postergação! Disse o senhor idoso ao menino.
– E o que é isso?
O velho explicou o que é postergação.
– Uai! mas não é isso que todo mundo faz?
Então o velho deu um longo suspiro e olhou para longe, como se procurasse alguma coisa, e disse: “É isso mesmo. As decisões são sempre adiadas, deixadas para depois. A gente fica esperando e nada acontece”. Falou isso com um ar triste, só faltando dizer que não tinha mais muito tempo para esperar.
– Então, vô, você acha que fica todo mundo empurrando com a barriga?
– Pois é, ficam protelando.
Ao que o cronista que não participava do diálogo, mas que tem direitos sobre o texto, acrescenta: Procrastinam, enrolam, adiam, retardam, pospõem, prorrogam, deixam ficar para ver como é que fica.
– Mas você não vive dizendo que o sono é bom conselheiro?
– Digo sim, mas quando acordo tomo uma decisão, errada ou certa, e faço alguma coisa. Quem adia por adiar, não faz nada, simplesmente porque não adiou para fazer, mas porque não queria fazer.
– Então é uma coisa feia, não?
– É, mas as pessoas se deixam enganar, até parece que gostam de ser enganadas, e para não ouvir um “não” preferem um suspense masoquista.
– O que é suspense e o que é masoquista?
– Sem essa, cara. Não é assim que gosta de dizer? Vamos parar por aqui e ver um desenho na internet.
– Não mesmo! Foi você quem começou, e agora quero saber de tudo. Me dê aí um exemplo de postergação.
– O canivete suíço que seu pai ficou de me dar e não deu.
– Isso é muito pouco. Uma coisa maior.
– O equilíbrio nas contas do governo. Já estamos em novembro e o governo segue empurrando com a barriga.
– Nossa, que barato. E ele gasta do jeito que quer?
– Gasta. E esse barato sai caro.
– Ah, vô. Esse Brasil é muito doido, não é?
– Supimpa.
– Me dá exemplos de pessoas que não postergaram ou não postergam.
– É fácil, veja só: Ayrton Senna, Pelé, Juscelino, Truman (o que mandou lançar a bomba atômica no Japão), Napoleão, Júlio César…Tem muita gente.
– Puxa vida! Mas isso é gente antiga. Me diz agora quem é que anda postergando.
– Isso não posso fazer. Iria desagradar a muita gente. Sua mãe lhe ensinou que a gente não deve desagradar aos outros, não é?
– Diz, vô, diz!
– Depois. Agora não.
– Mas, vô, aí você está postergando.
– O que é isso, menino! Olha a falta de respeito. Vai brincar, vai, vai…
Lindolfo Paoliello é cronista, autor de O País das Gambiarras, Nosso Alegre Gurufim e A Rebelião das Mal-Amadas.



