
Estes dias de julho, frios, azuis e tão bonitos, seriam melhores se não incomodassem os velhos e vitimassem os miseráveis. As crianças também sofrem, com sua capinha fina de gordura e sua resistência ao agasalho, não por não sentirem frio mas porque ele vem sob a forma de uma ordem e além de tudo incomoda, pesa, tolhe os movimentos.
Os velhinhos, temerosos, ficam quietinhos, tristes como passarinho doente. Abominam o vento, evitam sair de casa e tem-se a impressão de que evitam até falar, com medo de se desgastarem, perdendo energia.
A criança com frio também é um quadro triste. O peitinho magro fazendo movimento ansioso para respirar, deixa ver uma cavidade que provoca a sensação de fragilidade, e dá pena.
Mas o pior são os miseráveis. Que paradoxo o mundo! Na estação mais bonita, quando a gente se diverte com São João e Santo Antônio e as pessoas fazem fogueiras, soltam rojões, tomam canjica e quentão e namoram, nessa época é que os indigentes mais sofrem. É quando mais sentem a fragilidade do corpo e a falta da comida, da casa e das roupas.
Agora mesmo o frio que faz nas noites em Belo Horizonte está matando. E olha que não é frio pra valer, do tipo Maria da Fé e São Joaquim. Um friozinho bobo mas que na madrugada, agravado pelo vento, dói nos ossos e queima a pele.
Leio no jornal que um catador de papel morreu na madrugada passada sob uma marquise, segundo a notícia “deitado sobre um plástico e coberto com um tecido leve”. A marquise – dura ironia – era de uma loja de malhas. Nos bolsos do homem estavam uma receita médica e uma ficha de consulta expedida por um hospital. É a doença que mina a resistência e acelera a morte pelo frio. A Cruz Vermelha e os asilos para idosos estão recebendo agasalhos para os carentes. Convém ajudar. Nunca se sabe aonde vai soprar o vento frio de amanhã.
Lindolfo Paoliello é cronista, autor de O País das Gambiarras, Nosso Alegre Gurufim e A Rebelião das Mal-Amadas.