JK E A IMPRENSA: O QUARTO PODER

O presidente Juscelino Kubitscheck de Oliveira, durante o seu mandato na Presidência da República, proferiu [...]

O presidente Juscelino Kubitscheck de Oliveira, durante o seu mandato na Presidência da República, proferiu 408 discursos – 250 dos quais publiquei no livro “Mensageiro da Esperança”, que compõe a coletânea de 3 volumes, 2.336 páginas, intitulada “JK – Profeta do Desenvolvimento” – de minha autoria, publicada por MercadoComum, em 2018.

Por considerar muito adequado para o momento atual, desse total de discursos proferidos destaco o pronunciamento, realizado por JK, durante a solenidade de instalação do VII Congresso Nacional de Jornalistas, no Rio de Janeiro – DF, em 7 de setembro de 1957 e que foi o seguinte:

“É um lugar comum afirmar que constituís um poder; já vos qualificaram mesmo, meus caros jornalistas, de componentes do quarto poder em nossa pátria. Desejando exercê-lo vigorosamente, como é o vosso caso, não será fora de propósito lembrar-vos que a vossa ação atinge a vida nacional nos seus próprios fundamentos. Dais a interpretação dos enigmas, louvais e combateis os atos da administração, julgais os homens de Estado em todas as suas atividades. Sois, em muitos casos, decisivos, no influir nas disposições do espírito do povo, pois modelais a opinião pública, dais-lhe forma e conteúdo.

Maior, porém, que o vosso poder é a vossa importância, maior que o temor que as vossas armas possam inspirar é a responsabilidade que pesa sobre a vossa profissão, que a cerca e a acompanha. Tendes em vossa pena a orientação do povo. E isso, numa democracia, é tarefa fundamental. O que afirmais serve de base à conceituação de um homem público, e depende por vezes de vossa sensibilidade moral, de vossa imparcialidade, o destino de muita gente e o futuro de inúmeras causas.

Vossa responsabilidade é realmente imensa e não deve ser esquecida nos momentos em que formulais doutrinas, em que comunicais opiniões aos leitores que tanto confiam em vós, em que divulgais notícias que serão causa de providências que irão repercutir, não raro decisivamente, nos destinos da pátria.

Como toda obra de homens, tendes feito, ao longo de vossa carreira, muito bem e muito mal. Sem querer lisonjear-vos, pois aprendi que a lisonja não vos atinge, e que sois por natureza desconfiados e cautos; sem querer agradar-vos, posso dizer-vos que estou convencido de que fizestes muito mais bem do que mal e que o saldo de vossos labores vos é favorável. Não faço essa afirmação porque a necessite fazer, mas por ser de justiça. Basta rememorar aqui, entre outros feitos que tanto têm notabilizado o jornalismo, a vossa luta, em todos os tempos e em todos os países, pela liberdade. Defendestes o homem humano contra tudo e contra todos, e não o fizestes na tranquilidade que hoje desfrutamos aqui, mas no perigo, na aspereza, na tirania.

Vossa ordem, pois a imprensa é uma ordem, como a religiosa e militar, pode orgulhar-se dos serviços inestimáveis prestados à causa da liberdade, que é a própria causa da dignidade do homem. Quantos heróis e mártires não deu a imprensa, para que a verdade e a justiça pudessem ser proclamadas, sem que isso importasse em perigo! Quantas cabeças rolaram! Quantos cidadãos não conheceram os cárceres, o degredo e torturas para que as desigualdades fossem quebradas, os direitos reconhecidos, a escravidão abolida e considerada infame!

Nesta hora, meu pensamento se volta para as grandes figuras de nosso jornalismo, para os que pugnaram pela nossa independência, para os que se bateram contra a submissão degradante de uma raça, para os que reclamaram o direito do livre pronunciamento.

Podeis orgulhar-vos de vossa ordem, dos trabalhos e das grandes obras em benefício da igualdade entre os filhos de Deus, igualdade para o direito de opinião, igualdade para o direito de pensar; podeis orgulhar-vos, outrossim, do muito que fizestes contra o egoísmo, contra a injustiça social, contra a exploração mercantil do homem pelo próprio homem.

Mas para que o elogio tenha seu justo valor, é necessário lembrar que vítimas também foram feitas, injustiças foram consumadas, maldado o que não deveria ter sido maldado, algumas vezes desrespeitado o que estava a merecer respeito. Se a imprensa teve de enfrentar tiranias — ela mesma tiranizou por vezes e intimidou os que a desagradaram, os que não souberam captar-lhe a simpatia, os que não comungaram com as suas ideias.

É a imprensa, de todas as ordens humanas, a mais exposta às tentações, a mais sujeita às variações dos ventos que trazem e levam os acontecimentos.

Trabalhais na areia movediça do dia que passa, da hora breve, obrigada pelas contingências a segurar o fato, a ideia, a emoção em seu voo.

Pouco tempo para meditar dão as máquinas de imprimir; por isso mesmo, é preciso manter o espírito sempre prevenido, a disposição voltada sempre para à justiça. Nada é mais belo, mais alto, mais revestido de dignidade do que o amor à justiça. Sem amor à justiça, como poderá ter alguém coragem de julgar, de decidir e examinar os atos alheios! Para o exercício da profissão de jornalista, nenhuma qualidade é mais relevante e necessária do que o devotamento à justiça. Sois responsáveis pelo que o homem tem de mais precioso neste mundo, que é a sua reputação. Não se deve exigir de vós nem mesmo clemência, pois estais na vigilante defesa do interesse de todos. Mas que sejais justos é indispensável.

“Aqueles que ensinarem a justiça às multidões brilharão como as estrelas, para sempre e perpetuamente”. Está escrito no Velho Testamento (Daniel, XII, 3). É uma grande promessa, que se dirige a todos nós, em especial a vós, que levais a todos os recantos os acontecimentos do mundo.

Graças a Deus — numa classe tão grande quanto a vossa — muito numerosos são os que a prezam e a colocam acima de tudo. Já não há praticamente o jornalismo da calúnia e da mentira. Digo que não o há, praticamente, porque o que resta ainda está sendo liquidado pela indiferença do público.

Ninguém mais se interessa pelos que vociferam, pelos possuídos da mania de destruição, pelos que destoam dos princípios que regem o jornalismo sadio, pelos que atentam contra a vossa ética, meus amigos.

Por mais que estejais, alguns ou muitos de vós, em campo diverso do que ocupo politicamente; por mais que vos encontreis separados de mim pela militância oposicionista, independentes do que pensamos ou desejamos — acima de todas as dessemelhanças —, duas causas, dois interesses supremos nos ligam: a causa da liberdade democrática e a independência econômica do Brasil.

Conservar, melhorar, apurar, levantar o regime em que vivemos interessa sobremaneira aos homens de imprensa. A liberdade é o vosso elemento, a vossa condição de existência, o ar que respirais. Sem ela não pode existir a profissão que exerceis. Deveis colaborar na sua manutenção e na sua defesa, pois é esse o nosso dever e o nosso interesse. A melhor maneira de conservar a liberdade é respeitá-la nos seus semelhantes, é não usar da própria liberdade como meio de opressão alheia. Isso o sabeis e isso praticais, com as exceções lamentáveis, mas do estilo.

A outra causa comum que mesmo involuntariamente nos une é o desenvolvimento do Brasil, a consolidação de sua independência econômica, a melhoria de nível de vida de todos os brasileiros. Não há imprensa nem jornalistas realizados em nação subdesenvolvida, vós o sabeis e desnecessário se torna que eu insista nisso.

Temos, pois, duas causas afins; dois inimigos, que o são ao mesmo tempo do governo e da imprensa, a tirania e a pobreza, em cujo meio não é possível nem mesmo a prática da virtude para os homens, segundo Aristóteles e Santo Tomás de Aquino, nem para as nações.

Podemos marchar, pois, unidos, contra esses dois males de que devemos preservar nossa pátria.

Peço-vos que continueis inflexíveis na apreciação dos atos de meu governo. Quero confessar que não me seria possível governar sem imprensa livre. Constantemente me socorro do que dizeis para reexaminar o que acontece na minha administração. Desejo que permaneçais vigilantes, protegidos pela lei; livres para dizer o que quiserdes. Mas, em benefício deste país e de vós mesmos, praticai, cultivai e amai a justiça”.

*Carlos Alberto Teixeira de Oliveira é Administrador, Economista e Bacharel em Ciências Contábeis, com vários cursos de pós graduação no Brasil e exterior. Ex-Executive Vice-Presidente e CEO do Safra National Bank of New York, em Nova Iorque, Estados Unidos. Ex-Presidente do BDMG-Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais e do Banco de Crédito Real de Minas Gerais; Foi Secretário de Planejamento e Coordenação Geral e  de Comércio, Indústria e Mineração; e de Minas e Energia do Governo de Minas Gerais; Também foi Diretor-Geral (Reitor) do Centro Universitário Estácio de Sá de Belo Horizonte; Ex-Presidente do IBEF Nacional – Instituto Brasileiro de Executivos de Finanças e da ABDE-Associação Brasileira de Desenvolvimento; Atualmente é Coordenador Geral do Fórum JK de Desenvolvimento Econômico; Presidente da ASSEMG-Associação dos Economistas de Minas Gerais.  Presidente da MinasPart Desenvolvimento Empresarial e Econômico, Ltda. Vice-Presidente da ACMinas – Associação Comercial e Empresarial de Minas. Presidente/Editor Geral de MercadoComum. Autor de vários livros, como a coletânea intitulada “Juscelino Kubitschek: Profeta do Desenvolvimento”.

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