Estatísticas (por Luís Giffoni)

Há algumas joias raras da previsão. Por exemplo, disseram que, todos os anos, desaparecem no Brasil 0,02% das espécies vegetais ainda não catalogadas. [...]

A estatística, de vez em quando, se transforma na arte de adaptar os números à necessidade do momento. Em outras palavras, pode virar manipulação. E como vira. Muita gente não dá a mínima para a verdade e publica os dados que lhe interessa. Por exemplo, quando um ditador convoca eleições, em geral se reelege com 99% dos votos. Anuncia o resultado com a cara mais limpa. Na China, duas décadas atrás, o crescimento variava a gosto do governo, até que o país pagou caro pelas mentiras que o contaminaram. Ainda hoje, há quem desconfie dos índices. Um grande jornal paulistano, em campanha contra um governante, anunciou que 15% da população o rejeitavam. No fundo, tentava encobrir os 85% de aprovação obtidos pelo político.   

As inverdades ou meias verdades estatísticas invadem todos os setores. A guerra dos números atordoa. Mesmo em problemas que podem comprometer o futuro da humanidade. Por exemplo, há quem diga que, em 2100, 50% das geleiras não mais existirão. Outros, como alguns auxiliares de Trump, juram ter 100% de certeza de que estamos no meio de uma era do gelo e seus efeitos logo aparecerão. A crise climática seria, portanto, uma balela. Para comprovar, mostram alguns dados obtidos no Himalaia. Entretanto, mais de 90% dos cientistas defendem a tese contrária. Uma das provas viria justamente das geleiras do Himalaia. 

Há algumas joias raras da previsão. Por exemplo, disseram que, todos os anos, desaparecem no Brasil 0,02% das espécies vegetais ainda não catalogadas. Posto de outra forma, serão extintas 0,02% das espécies desconhecidas ou até hoje ainda inexistentes para os botânicos. Parece piada. Merece um Nobel da Ignorância, o famoso IgNobel, quem afirma tal coisa. Aliás, neste ano, meu candidato a IgNobel da Paz é o ignóbil Trump. Acho-o imbatível. Ainda falando de ignorância, publicaram que 70% dos alunos colam nas provas. Boa notícia! Jurava que eram 99,999%.   De todas as estatísticas divulgadas, minha favoritíssima afirma que 78,25% dos alienígenas que nos visitam vêm de fora da Via Láctea. Depois dessa, eu que vivia nas nuvens ando 78,25% mais à Terra. Com tanta gente estranha no planeta, concluí que a guerra estatística é coisa de ET. Ou do diabo. Tenho 66,6% de certeza.   

Luis Giffoni é Escritor, Membro da Academia Mineira de Letras. Prêmio Jabuti