
* Nota da Redação: artigo escrito em outubro de 2014, para se ler em qualquer tempo
Estava aflito para assistir ao debate dos dois ministros da economia, o atual e o do porvir. E fiquei completamente frustrado. O ministro do porvir parecia entediado, como se a ele só coubesse dizer: está tudo errado, o modelo está errado. Falou para dentro. Eu sei o que ele está falando e não acho que esteja errado, mas nada disse. Estava entediado. O ministro da situação deu-lhe uma aula de política. Falou sobre vender caminhões, coisas assim, no consumo. Foi uma conversa de loucos, na qual o ministro da permanência passou uma navalha no ministro que quer entrar. E todos perdemos. Ninguém pode ser contra o consumo, ninguém pode ser contra a felicidade das pessoas. O problema é a felicidade no longo prazo, questão sobre a qual os dois foram omissos, requer pagamentos e tem custos. A gente, ao oferecer vantagens, saca sobre o futuro. O ministro da permanência deu uma caneta no outro, entediado.
O problema é a felicidade no longo prazo. Sem felicidade no longo prazo, não há razão para o Estado ou para as famílias.
O conflito não se resume entre aqueles que são contra os pobres e a favor dos pobres em qualquer. Ninguém há de ser contra os avanços dos 20 anos. Não há como voltar atrás. Só temos que ir à frente. Ninguém, em sã consciência, é contra os pobres ou contra o Nordeste. Quem diz o contrário simplesmente não tem vergonha ou caráter.
Todos os cientistas sociais, economistas entre eles, sabem que há uma conta a ajustar ali à frente. Tem uma encrenca ali à frente. As contas não vão fechar. Em conversa simples, trata-se de estoque vs fluxo. Há quem queira ajustar mais rápido, há quem queira ajustar depois. Seja como for, teremos que ajustar. Não dá para viver de fluxo, se queremos ser grande potência.
Essa coisa de fluxo e estoque parece coisa de dono de boteco, não é mesmo? Mas não dá para viver de fluxo para sempre. O fluxo varia em função de muitas variáveis e se você fica dependente dele, fica dependente de uma concepção de Estado que não fica em pé.
Aí é que mora o perigo final. Doutrinas, algumas das quais adotei por um tempo de vida, como esquerdista adolescente, precisam ter consistência numérica no longo prazo. Em resumo: fluxo é bom, mas estoque é mortal.
Edson de Oliveira Nunes é Ph.D. em Ciências Políticas pela Universidade de Berkeley. Foi Presidente do IBGE, Presidente do Conselho Nacional de Educação. É Professor Emérito da Universidade Candido Mendes. Autor

