Os custos invisíveis da IA: a matemática que ninguém quer fazer (por Daniel Branco)

Nos últimos meses, o debate sobre Inteligência Artificial ganhou uma camada curiosa: quanto mais a tecnologia avança, mais ficamos fascinados com o que ela produz, e menos percebemos o que ela consome. [...]

Nos últimos meses, o debate sobre Inteligência Artificial ganhou uma camada curiosa: quanto mais a tecnologia avança, mais ficamos fascinados com o que ela produz, e menos percebemos o que ela consome.

Falamos de modelos cada vez maiores, mais rápidos, mais impressionantes.
Mas quase ninguém fala do que está por trás disso tudo.
É como admirar o brilho de uma cidade vista de cima, sem notar que cada luz acesa exige uma usina inteira funcionando sem parar.

A IA não é só algoritmo.
É energia, é água.
É chip, é infraestrutura.
É limite físico.

E toda vez que ignoramos esses limites, criamos a ilusão de que a IA pode crescer para sempre, como se estivesse acima do mundo real, livre das restrições que valem para qualquer outra tecnologia.

Só que o mundo real já começou a cobrar a conta.

Estudos internacionais mostram que os data centers consumiram cerca de 415 terawatt-hora em 2024. É o equivalente a mais de 1,5% de toda a eletricidade do planeta. E a mesma análise projeta que isso pode chegar a quase o dobro até 2030.

Isso sem contar a água usada no resfriamento e a pressão sobre redes elétricas locais que já operam no limite.

Enquanto achamos que estamos apenas “perguntando coisas para a IA”, estamos, na realidade, acionando uma cadeia pesada que exige energia constante, resfriamento, servidores especializados e chips raros que dependem de processos industriais complexos.

Nada disso é mágico. Nada disso é invisível. Apenas não olhamos para lá.

E se a energia preocupa, a lógica econômica preocupa ainda mais.

Modelos maiores consomem muito mais do que entregam em ganho marginal de qualidade. É a velha lei dos retornos decrescentes, agora travestida de saúde tecnológica.

O hype nos vende a sensação de “crescimento infinito”, mas a matemática da IA lembra que tudo tem teto, inclusive o tamanho dos modelos, a capacidade das redes elétricas e o bolso das empresas que precisam manter tudo funcionando.

Mas talvez o ponto mais sério seja o que vem a seguir.

A IA está escapando do campo da tecnologia e entrando no campo da infraestrutura crítica.
O que antes parecia apenas “software” agora concorre com hospitais, indústrias, iluminação pública e serviços essenciais pelo mesmo recurso: energia, um recurso finito, disputado e sensível.

E aí surge o dilema central:

Estamos preparados para viver num mundo em que cada pedido que fazemos a um modelo de IA tem custo real, ambiental e econômico, mas ninguém enxerga esse custo?

O risco não é só ambiental.
É social. É político.

Porque toda vez que uma tecnologia se torna invisível demais, tendemos a acreditar que ela não tem limites. E toda vez que acreditamos que uma tecnologia não tem limites, fazemos escolhas ruins, nas empresas, nos governos, no cotidiano.

Chamamos de “avanço” algo que, sem perceber, pode estar apenas redistribuindo pressões, desgastes e recursos que serão cobrados depois.

A pergunta que fica é simples, mas incômoda:

Quanto da expansão atual da IA é inovação, e quanto é apenas consumo disfarçado?

E, principalmente:

Vamos continuar tratando a IA como se fosse infinita… até o dia em que ela nos lembrar que, não é?

Daniel Branco
Ser humano, Economista
Empreendedor e Mentor
Especialista em IA Aplicada

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