Eu sou muitas em uma e carrego o tempo das árvores (por Mbaima Montay Puri)

Ao som de ñaman (água) lembrando o nosso ñamantuza butan (rio doce), que sofre muito ainda após o maior crime ambiental cometido por mineradoras como [...]

“Enquanto tiver gente aqui, nós também estamos aqui”

Ao som de ñaman (água) lembrando o nosso ñamantuza butan (rio doce), que sofre muito ainda após o maior crime ambiental cometido por mineradoras como a SAMARCO, BHP e a Vale, que até hoje não indenizaram as comunidades indígenas de Minas Gerais que sofreram com a negligência destas empresas; Ailton KRENAK ecoa em uma recente gravação, a voz dele, a voz dos atuais 391 povos originários e de todos os mais de 500 que foram silenciados, apagados, escravizados, assassinados, desde 1500, início da invasão europeia em Pindorama (Terra das Palmeiras), destruída e substituída por Brasil.

Olá! Eu sou MBAIMA MONTAY, mulher indígena do povo PURI, pertenço à KRIM ORUTU, Comunidade Indígena do Estado de Minas Gerais, em retomada, liderada por uma grande mulher, DAUÁMA (Cacica) PUONÁ XIPU PURI; localizada em território ainda não demarcado e homologado, em Ituetá, leste de MG.

Este é o meu primeiro artigo aqui no CAPABRASIL e como de costume tradicional indígena, começo me apresentando.

Ei! Como é que “cê tá”? Sou filha, irmã, tia, neta, bisneta, tataraneta, tatatatara… neta de mulheres e homens indígenas. Como muitas outras pessoas que nasceram após o século 16, aqui no Brasil, tenho sangue europeu e africano, o quê não me resume em parda, negra, afro- indígena, branca ou qualquer outra nomenclatura criada e propagada para o resultado que vivemos hoje, iniciado por miscigenação com estratégia portuguesa de esbulho e apropriação de tudo que somos, da natureza não humana que guardamos: invisibilidade, desigualdade, discriminação, racismo racial, ambiental, cultural, emergência climática, consumo desenfreado, dinheiro cada dia mais caro… pessoas adoecidas por terem sido desenvolvidas de quem as gerou: a axe (terra).

Nasci em um aldeamento indígena, em Teófilo Otoni, MG. Ah! quero falar de Teófilo Otoni, mas não hoje. Poucas pessoas sabem que ele foi quem implantou o liberalismo no Brasil, propagou o agronegócio e criou a primeira estrada de ferro, Rio-Bahia, com mão de obra indígena e africana, escravizadas; entre outras ações de desenvolvimento do país – e aqui, vamos combinar uma coisa? Toda vez que eu disser a palavra des-envolvimento, por favor entenda: desconexão, desligamento, afastamento da primeira natureza: terra, água, ar, sol, lua, árvore, outros animais além de nós e seres viventes. Para nós indígenas, somos envolvidas nesse meio ambiente com quem convivíamos integradas, especialmente nós PURI, povo das águas, das florestas, das árvores. Entretanto, com a estrutura organizacional de sociedade que ainda temos, formada por homens brancos, apenas brancos, eurocentrada e colonial, fez com que todos os povos fossem desenvolvidos por meio de decisões de líderes adoecidos, desenvolvidos e muitos, desumanos.

“A pior desigualdade é a desigualdade de oportunidade”, frase que ouvi recentemente no evento hsm+, de André Esteves, Fundador da BTG Pactual.

De quais oportunidades estamos falando? Para nós indígenas que resistimos, reexistimos há 525 anos após invasão europeia, existimos e lutamos até mesmo pela oportunidade de existência, pois somos invisibilizados em todo território nacional, em todos os espaços. Basta você olhar ao seu lado, com quem você convive? Quantas pessoas indígenas e negras, pessoas de povos tradicionais como “ciganos” você encontra nos lugares que frequenta? Quantas delas são mulheres? Quantas destas podem ser quem são?

Eu sou muitas em uma e tenho o tempo das árvores para te contar minha jornada de vida e visão de mundo, mas a mais importante delas eu já disse nesse nosso primeiro envolvimento: sou MBAIMA MONTAY, mulher indígena PURI. Convido você a me acompanhar por aqui.

Até o próximo capítulo. TENUAHI (gratidão)

Mbaima Montay Puri
Curadora Ancestral de Ciclos, Conselheira, Palestrante, Escritora e Orientadora de líderes que transformam o mundo

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