
A primeira notícia que se tem do Brasil é um depoimento de alegria, de um escrivão impressionado com a felicidade dos nativos que “folgavam e riam”.
Folgando e rindo, os brasileiros fizeram História, descobriram ouro, rebelaram-se, proclamaram a República e, bem ou mal, construíram uma nação. Sempre folgando e rindo, inventaram o samba e o carnaval e transformaram o futebol quadrado dos ingleses num espetáculo de alegre coreografia. Em todas as manifestações da nossa arte, sempre esteve presente o humor brasileiro; a charge é, desde o Império, a marca registrada do nosso jornalismo e quando Walt Disney quis retratar o brasileiro em um dos seus personagens, criou Zé Carioca, um papagaio malandro e brincalhão.
Acho que foi Stendhal quem falou que, em Londres, há dias em que as pessoas se enforcam sem motivos sérios, somente por influência do meio. Mas aqui? Aqui, já dizia Olavo Bilac, há “um perpétuo sorriso aberto em tudo”. E não é preciso ser nenhum Durkheim para constatar que esta natureza alegre e quente favorece o riso.
Mas, gradativamente, a gente nota que esse riso vai mudando de feição, perde espontaneidade e vai ficando um riso sério e refletido. E a gente vê, neste riso, uma ponta de tristeza fantasiada de alegria.
Li, um dia desses, um excelente artigo do professor Paulo Moura, em que ele dizia que o comportamento individual e o das massas, em situações de crise, seguem uma trajetória. O primeiro momento é o da perplexidade diante da própria constatação da crise e de que suas respostas anteriores são impotentes para assegurar o equilíbrio. Depois vem a insegurança, acompanhada de tensão e ansiedade, desaguando na apatia, a sensação de desproteção e de abandono que dá uma vontade enorme de dormir e só acordar quando tudo tiver passado.
Não é este o estado de espírito que se observa por aí? O brasileiro anda triste. A frase da nossa infância: “quem espera sempre alcança”, já não se ouve mais; as pessoas vão se cansando de esperar. E como para se alcançar alguma coisa é preciso “esperar com toda a alma”, vai ficando cada vez mais difícil alcançar o que quer que seja.
Daí é que surge esse riso triste. Sem ânimo de encarar de frente a vida, mas ainda com um fio de humor que está na sua alma coletiva, os brasileiros apelam para a ironia, que Machado de Assis chamou de “pudor da razão diante da vida”. O brasileiro sempre foi paciente como um boi, mas éramos um povo alegre. Pena que tanta incerteza, tanta desesperança, contribuam para que ele se vá tornando resignado e triste, como são os bois.
Lindolfo Paoliello é cronista, autor de O País das Gambiarras, Nosso Alegre Gurufim e A Rebelião das Mal-Amadas.