O envelhecido mundo novo

Assim como as baratas e formigas a espécie humana é uma das que mais e melhor se adaptou à face da terra. [...]

Assim como as baratas e formigas a espécie humana é uma das que mais e melhor se adaptou à face da terra. Ao longo de milênios transformou-se na dona e senhora da natureza, com grandes lutas e inevitáveis transtornos, evoluindo a cada tempo graças ao acumular de conhecimento, criatividade, prodigiosa memória e uma série de conveniências morfológicas próprias. Nenhuma espécie tem tanto domínio sobre a natureza e dela tirar tantos proveitos quanto os humanos. A sua ciência e desenvolvimento tecnológico tem ajudado nas transformações e superação da vida. Sua expansão demográfica ocupou toda a terra, habita os mais inóspitos ambientes e, até então, não parava de crescer. Mas, um fator novo está acontecendo e poderá mudar esta tendência e processo evolutivo. Começamos a reproduzir menos. São inúmeros os efeitos deste novo tempo, impactando fortemente a economia, a qualidade e o próprio sistema de vida da espécie.   

Recentemente o Banco Interamericano de Desenvolvimento ((BID) em parceria com a Fundação La Caixa (Espanha) e importantes atores internacionais públicos e privados realizaram em Barcelona, o Fórum da Economia Prateada Europa-América Latina e Caribe para enfrentar os desafios e oportunidades decorrentes do rápido envelhecimento das sociedades, especialmente da América Latina e Caribe.

Livia Hollerbach, pesquisadora mineira de Belo Horizonte, consultora do BID Lab para Economia Prateada na América Latina e Caribe, head de inteligência de Dados e comportamento, executiva da Data8, empresa de estudos sobre Economia e Longevidade, foi nossa representante, quando apresentou dados, pesquisas e informações sobre o estado atual de envelhecimento da sociedade e crescimento demográfico. Sua apresentação baseou-se nos fatores deste novo tempo:

– “O mundo caminha para a era do despovoamento”, ou depopulation – uma nova palavra que será tendencia logo, logo. Estamos nascendo menos e cada vez mais rápido. Em 30 anos, 3/4 dos países do mundo não terão taxas de fertilidade suficientes para manter sua atual população. E já está acontecendo, em 2023 a Coreia do Sul, registrou uma taxa de fertilidade de 0,72, a América Latina e Caribe, chegou a 1,85 e o Brasil a 1,60 (sendo que a taxa de reposição ideal para manter a população do país é de 2,1 filhos por mulher.

– “O mundo caminha para a longevidade”. Nascemos menos e vivemos mais. Desde 2019, em todo mundo, já há mais pessoas acima de 65 que crianças de até 5 anos. No Brasil, a população com mais de 50 anos já corresponde a 27% (59 milhões de pessoas) e em apenas 20 anos, chegará a 40%.

– “A Região da América Latina e Caribe é a que envelhece mais rápido no mundo, sem antes equilibrar sua desigualdade interna”. Bem diferente de países europeus, que ficaram ricos e depois envelheceram, os brasileiros estão envelhecendo muito rápido e pobres. É evidente que aumentará a pressão nos sistemas de aposentadoria, saúde e cuidados, sem dizer da desigualdade social.

– “A desigualdade de gênero se aprofunda na era do cuidado”. Um papel historicamente delegados às mulheres, o cuidado com os mais velhos na família cria um contexto mais desafiador para ela no trabalho e na geração de renda. A preocupação da Geração X com o próprio envelhecimento pode mudar esta equação.

– “A informalidade cresce entre a população madura”. O trabalho informal acaba sendo a saída para grande parte da população longeva dentro de um mercado tradicional despreparado, que fecha as portas para uma força laboral ainda muito ativa e com bagagem de vida.

– “Precisamos falar da solidão não desejada”. Também reflexo da diminuição das famílias, há um enorme contingente de pessoas vivendo vidas reclusas e solitárias, um caminho perigoso para a depressão e isolamento social.

– “A Economia Prateada é uma extremidade positiva desse “Tsunami Prateado”, termo usado desde 2018 pela Data8 para definir este novo momento. A população acima de 50 anos já movimenta 22 bilhões de dólares anualmente na compra e consumo, sendo considerada a terceira atividade econômica do mundo (perde pra China e EUA) No Brasil, a Data8 mensura que em 2024 os idosos brasileiros representaram 24% do PIB, o que significa R$ l,8 trilhão. Em 20 anos este número duplica.

– “A longevidade produtiva é nossa saída”. Nossa maior meta como humanidade, nos próximos anos, é aumentar a capacidade produtiva desta população prateada. Precisamos urgentemente repensar a idade para aposentadoria e modelos flexíveis de jornada laboral, além de políticas de retenção de capital intelectual na região.

– “Intergeracionalidade. Um conceito urgente para sair da teoria”. Precisamos de novos modelos e maneiras de pensar a velhice que incluam a lente da intergeracionalidade. Nas famílias, nas comunidades, nas empresas, na sociedade. Diálogo e interação entre distintas gerações para construir esse novo futuro – despovoado e longevo.

Diante desta nova realidade são três os grandes pilares da transição demográfica que o BID-LAB começa a pavimentar:  melhoria nas estruturas públicas e privadas de saúde e cuidado, novas políticas de incentivo à empregabilidade e empreendedorismo maduro, e inclusão financeira para prateados, são estratégias macro da organização para a região.

Um novo tempo de envelhecidos habitantes humanos marcará a sobrevivência na terra. 


Nestor de Oliveira é Jornalista e Escritor