Buscam-se fabricantes de nascentes!

Faz muitos séculos, a peste varreu do mundo muitos milhões de pessoas. No século XIX, por escassez de terra [...]

Faz muitos séculos, a peste varreu do mundo muitos milhões de pessoas. No século XIX, por escassez de terra agriculturável, muitos europeus ficaram desnutridos, morreram de fome ou tiveram que emigrar para as Américas. No século XX, o petróleo provocou guerras sangrentas e hoje é o principal culpado pelo aquecimento global. Escapará o presente século de uma catástrofe desse porte?

Ao que parece, estamos perigando. Se viermos a ter um cataclisma equivalente, é muito provável que seja pela falta de água. Há mais de trinta países que podem entrar em guerra, brigando pela pouquíssima água disponível.

O Brasil, com suas abundantes águas e aquíferos, está longe de uma crise. Pena que não seja verdade. Os sinais de escassez de água são nítidos para os cientistas do clima. Rios como o São Francisco, o Doce, o das Velhas e muitos outros não têm hoje a metade do fluxo de água que tiveram, faz poucas décadas. Há pouco mais de um século, a cidade de Sabará era servida por navios a vapor. Hoje, banhando a cidade, o rio das Velhas pode ser atravessado a vau, apenas arregaçando as calças.

Soa o alarme, o Brasil não está longe de uma séria e penosa crise de água. E isso vem junto com o aquecimento e as oscilações violentas do clima, como já estão acontecendo.

Vingança de Deus? Não, simplesmente, burrice e imprevidência dos homens, ao devastarem as florestas do nosso país. Sem elas, a água da chuva escorre célere, pelo solo pelado. Com elas, fica retida nas próprias árvores e em verdadeiras caixas d’água subterrâneas, produtos da lenta absorção. Ao longo do ano, esse mundão de água infiltrada abastece os lençóis freáticos e as nascentes. Mas é inevitável, cortou a floresta em cima, embaixo some a caixa d’água.

Hoje, há curas para a peste bubônica. A revolução agrícola permite obter muito mais alimentos da mesma terra. E aparecem substitutos para o petróleo.

Com relação à escassez de água, há uma solução bem fácil: trata-se de reverter o processo de desmatamento, ou seja, plantar árvores. Após o reflorestamento, voltam as nascentes aos nossos campos degradados. Na antiga fazenda do celebrado fotógrafo Sebastião Salgado, alguns anos depois de haver plantado uma nova floresta, surgiram mil e quinhentas nascentes. Plantar árvores é como fabricar nascentes.

E de quebra, há outro benefício gigantesco. O tronco de qualquer árvore contém 50% de carbono. Como este não existe na terra, só pode vir do ar. Ou seja, a árvore come carbono (no caso, dióxido de carbono), para transformá-lo em pau. Ora, o aquecimento global é alimentado pelo excesso de carbono na atmosfera.

Sendo assim, as árvores fazem dois serviços, aumentam as águas e absorvem carbono. Não deveríamos também falar de um terceiro beneficio? Suas agradáveis sombras.

O Brasil tem condições de mitigar uma catástrofe climática e, assim, garantir nossa trajetória de liderança na produção de alimentos. Ou mesmo, tornar-se uma potência, também na silvicultura. Basta cuidar com desvelo do nosso meio ambiente e de nossas florestas.

Se queremos ter água para nós mesmos e para nossos descendentes, não pairam dúvidas sobre o que devemos fazer. É plantar árvores, muitas, por todos os lados. Equivale a plantar nascentes.

Aqui fica um convite ambicioso, mas possível: Plantemos um bilhão de árvores! Na ponta do lápis, se muitos cooperarem, é possível e nem tão difícil assim. Precisamos fazer um mutirão das árvores.

Claudio de Moura Castro é Ph.D. em Economia pela Universidade de Vanderbilt. Foi Professor Visitante em várias Universidades, como Chicago, Genebra, Borgonha, FGV, Brasília. Foi Presidente da CAPES. Autor, Prêmio Jabuti.

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